Sobre maconha
Ok, vou falar de maconha. Terminei semana passada de ler o novo livro de Sidarta Ribeiro, As flores do bem: a ciência e a história da libertação da maconha, publicado pela Fósforo. Eu, maconheira, peguei logo pra ler. Sidarta é neurocientista bem conhecido da galera pelo seu jeito simples de tratar de temas científicos — ainda tô pra ler os livros dele sobre sonhos —, e aqui vai trazer FATOS, CIÊNCIA, para falar da plantinha e desmistificar o que dizem aí sobre ela.
Ele começa o livro relatando uma história pessoal, em que seu irmão, na adolescência, virou maconheiro e isso separou a família. Tanto ele quanto a mãe se afastaram do cara, tinham essa coisa de falar que a maconha tinha levado ele para o “mau caminho". Eu pensava muito isso também, afinal, fui criada com as propagandas da Eliana dizendo não às drogas (embora na minha época ainda não tivesse PROERD). Mas assim como eu, Sidarta deixou de considerar a maconha a grande vilã de seu caos familiar durante a universidade, onde usou pela primeira vez. Eu demorei um tanto mais pra fazer isso, mas é nesse ambiente de baderna mesmo que a gente vê a galera fumar com a maior tranquilidade.
E no contato com a canabis, ele descobre como ela é utilizada há milênios para algo bom. A partir daí, Sidarta passa a mostrar as pesquisas que existem sobre o efeito da maconha em tratamentos de epilepsia em crianças, no tratamento do câncer, do Parkinson e de outras doenças que podem ser severas e debilitantes. Ele fala de associações familiares de pacientes que começaram a lutar pelo direito de plantarem suas próprias flores para tratar essas pessoas. Mostra os avanços nas políticas públicas para liberar o uso medicinal e recreativo da maconha. E lendo tudo isso você fica: mas gente, por que proibir? Não faz sentido algum.
E aí chega, claro, na questão mais urgente: o mercado ilegal e violento que existe por causa da proibição. Há muita gente lucrando com o tráfico que não quer largar essa bola. É um puta dinheiro que eles deixariam de ter, é um poder que perderiam. Há muita gente presa por causa de uma proibição baseada em mitos sobre uma planta, gente que poderia ser um trabalhador legal e registrado, com todos os seus direitos, no mercado legal da maconha. E não adianta liberar o uso apenas para quem pode pagar 3 mil reais por alguns mililitros de óleo de CBD. Não dá, também, pra entregar o negócio nas mãos de uma empresa farmacêutica que vai colocar os preços do negócio lá em cima. Há avanços, mas eles ainda são inacessíveis para muita gente que poderia se beneficiar da flor. E bota aí também as questões raciais, né (é muito mais fácil eu, branquela, ser maconheira). Ele aborda tudo isso, além da parte científica da coisa.
Sidarta explica muito bem esse lance de CBD e THC e cada detalhe dos efeitos da maconha sobre o nosso cérebro. Sim, se você fumar antes dos 21 anos, há um efeito maior sobre seus neurônios, porque até essa idade os bichinho ainda tão se desenvolvendo. Porém, para quem começa a fumar depois de adulto, Sidarta fala que a maconha ajuda a pessoa a reter melhor as memórias mais antigas, então no fim ela não destrói nossos neurônios, e sim fortalece eles. Maluco isso, não? E eu preocupada de virar um zumbi incapaz de fazer qualquer coisa quando dei a primeira tragada num beck.
Claro que nem tudo são flores — aaaaah, perdão. Tudo o que é usado em demasia faz mal. É possível fumar demais a ponto de capotar, mas você jamais vai morrer por overdose de maconha. Aliás, o índice de vício da maconha é apenas de 8% após o primeiro uso, bem menor do que qualquer outra droga por aí. Mas vê como muito do que a gente pensa sobre isso, quando não tem contato, vem de uma política contra as drogas sem fundamento científico algum? Doideira.
Eu sei, por exemplo, que tem dias que eu exagero. Me escoro na maconha pra tentar aliviar sintomas do meu desconforto existencial. Procuro não fumar assim que levanto, mas já fiz muito isso no começo. O maior efeito é a preguiça física, porque a mente continua funcionando e eu continuava fazendo coisas. Mas essa letargia cobra eu preço, uma hora.
O negócio é que existe uma Taize Antes da Maconha e Depois da Maconha. Quando eu não fumava, eu ficava noiando sobre qualquer coisa, antecipando toda ação que deveria fazer. A ansiedade, oh, lá em cima. O medidor de estresse já chegando no limite. Quando maconheira virei, encontrei uma maneira de conseguir descansar. De fazer a minha cabeça desacelerar e fazer as coisas com mais calma, e não na correria em que sempre vivi. De conseguir travar preocupações que apareciam antes da hora. A maconha me destravou pra muita coisa, fazer tarefas ficou mais… fácil. Porque eu passei a fazê-las sem me preocupar tanto com isso. E pra quem acha que todo maconheiro é desatento (acontece sim, risos), saber que estou num estado que pode afetar a minha atenção me faz ficar mais atenta. Então sei lá, de alguma forma, pra mim, funciona.
Não quero soar como MILITANTE QUE QUER ENFIAR MAÇONHA GOELA ABAIXO DE TODO MUNDO. Bem longe disso. Mas esse medo e estigma criado em cima de uma flor não ajuda a ninguém. E já que eu tenho a liberdade de falar sobre isso (minha mãe sabe, fiz questão de contar, e os familiares que me seguem no Instagram já foram confrontados com imagens de baseados bonitos, pois bolo bem), eu vim aqui dar os meus pitacos.
Leiam As flores do bem, dê esse livro para alguém que poderia se interessar a ler também. Eu tô pensando em indicar pra minha mãe, que vem aqui pro Natal, inclusive. Ela ficou bem assustada com a revelação, chegou até a rolar uma briguinha, mas acho que hoje ela está ok com o fato de ter uma filha maconheira (e viu que tô sobrevivendo bem). Essa seria uma boa leitura pra fazer ela pensar em maconha com outra perspectiva, eu espero.
Falando em indicar leituras, tem outro livro aqui esperando na fila que é Baseado em papos reais, do Bruno Levinson, que tem entrevistas com pessoas envolvidas de alguma forma com a maconha falando de boas sobre a planta. E, claro, o romance Clube dos jardineiros de fumaça, da Carol Bensimon, que é um livraço que envolve esse tema.
É isso aí.
Uhul, saiu um texto! Nem que seja assim meio freestyle. Agora vou lá passear com o cachorro, pois negligenciei ele para estar aqui escrevendo.
Beijos, até a próxima news. :)
Coisa boa é morar em país que tem a maconha liberada e vc sabe a procedência, quanto de thc ou cbd tem, se é sativa ou indica, tem embalagens bonitinhas e opção de chocolate, gummy ou bebida (tipo um refri)... nisso não tenho oq reclamar do Canadá
Adorei esse textinho informativo e alto astral. Aqui a macoia ajuda bastante a manter meu humor feliz, soninho gostoso e apetite desejável, mas limito bastante (uso mais em dia de folga)